terça-feira, setembro 25, 2007

O Mercosul e a Venezuela

Rubens Barbosa
A Venezuela, em outubro de 2005, solicitou formalmente sua inclusão como membro pleno do Mercosul e, em dezembro, os países membros assinaram um acordo marco nesse sentido. Em julho de 2006, foi assinado o Protocolo de Adesão, que deverá entrar em vigor após a aprovação pelos Congressos dos quatro países membros e pelo Congresso venezuelano. Os Congressos de Venezuela, Argentina e Uruguai já aprovaram o referido protocolo. Brasil e Paraguai ainda não completaram o processo de ratificação. O ingresso da Venezuela ou de qualquer outro país no Mercosul, pela complexidade, as implicações institucionais e em relação às negociações de acordos comerciais com outros países, deveria ser objeto de uma análise isenta e objetiva. O artigo 20 do Tratado de Assunção, que criou o Mercosul, prevê que todos os países membros da Aladi podem solicitar adesão ao bloco, como fez a Venezuela. O artigo 2º do tratado determina que um dos fundamentos do Mercosul é justamente o princípio da reciprocidade de direitos e obrigações entre os Estados partes. O Protocolo de Adesão criou um Grupo de Trabalho que, em 180 dias (até 5 de março de 2005), deveria detalhar esses compromissos e estabelecer o cronograma para a adoção do conjunto de normas do Mercosul e para a adoção da TEC pela Venezuela; estabelecer o programa de liberalização comercial e definir as ações necessárias para a adesão pela Venezuela aos acordos comerciais assinados pelo Mercosul. O informe final do GT foi aprovado pelos governos, mas deixou sem conclusão a maioria das questões técnicas e comerciais. As negociações estão suspensas desde março, quando os países membros do Mercosul decidiram criar outro GT, ad hoc, para tentar concluir os trabalhos em 180 dias, prorrogáveis por mais 180, a partir de 1º de outubro. Para melhor entender a situação que prevalece hoje, nos próximos seis meses deverão ser resolvidas as pendências não resolvidas até aqui: - Cronograma de adesão ao acervo normativo do Mercosul (do total de 783 normas, há 169 sem indicação de prazo para adoção pela Venezuela); - Cronograma de adesão à TEC (foram estabelecidos os prazos e o percentual de produtos, mas não as listas de produtos que estarão em cada etapa); - Cronogramas para implementação do livre-comércio (o GT não conseguiu concluir negociação de cronograma de liberalização entre Venezuela e Argentina e entre Venezuela e Brasil); - Adesão aos acordos negociados com terceiros países (não houve nenhuma definição e foram concedidos mais 270 dias para a Venezuela estudar as propostas nesse tema). De conformidade com o documento assinado pelos cinco países e segundo a prática do direito internacional, não será possível o Congresso Nacional aprovar o Protocolo de Adesão antes que as tarefas do Grupo de Trabalho ad hoc estejam concluídas. Trata-se de uma questão técnica, não política. Foi noticiado que o ministro Celso Amorim, em encontro em Brasília, no mês de agosto, teria deixado claro ao Chanceler da Venezuela, Nicolas Maduro, que o Congresso dificilmente aprovaria o protocolo sem a conclusão das negociações técnicas. Por uma decisão política dos países membros, já que o Tratado de Assunção não prevê essa categoria, a Venezuela, a partir da assinatura do Protocolo de Adesão, passou a ser considerada como membro pleno do Mercosul em processo de adesão. Essa decisão permite aos representantes daquele país participar de todas as reuniões, inclusive de negociações de acordos comercias, com direito a voz, mas não a voto. Cabe ressaltar que a Venezuela já aderiu a diversos protocolos do Mercosul, como o de Ushuaia, que consagrou a cláusula democrática. A discussão no Congresso Nacional sobre o ingresso de qualquer país como membro pleno no Mercosul deveria cingir-se à analise dos compromissos, direitos e obrigações assumidos perante os países membros. É possível que a Venezuela, por razões econômicas ou de política interna, esteja buscando uma justificativa para desistir e recuar de sua intenção inicial de tornar-se membro pleno do Mercosul. O Congresso não deveria entrar no jogo público estimulado pelo presidente venezuelano. Considerações de outra natureza que não as técnicas - e haveria inúmeras - desvirtuariam a objetividade do debate e dariam desculpa para que o ônus da desistência da Venezuela recaísse sobre o Brasil. RUBENS BARBOSA é consultor de negócios e presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp.
Fonte: O Globo

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